quarta-feira, 20 de maio de 2020

A inquietude das reformas tem solução

Esta imagem deixou todos inquietos

Até onde pode ir uma intervenção irresponsável, uma reforma sem acompanhamento técnico e o poder do síndico? A imagem acima deixou engenheiros, arquitetos e todos que tinham o mínimo de bom senso, inquietos ao redor do mundo. Onde está o limite de uma reforma em uma unidade condominial de uma edificação?

O mercado de reformas em unidades condominiais (apartamentos) sempre foi muito aquecido, mesmo em épocas de crise da construção civil, pois quando não se pode adquirir um novo apartamento, o melhor a fazer é reformar e remodelar o próprio imóvel. Porém uma escolha errada pode transformar um sonho em um pesadelo ou até mesmo em uma tragédia. Embora seja de conhecimento geral que obras são o metiê dos engenheiros e arquitetos, a grande maioria de condôminos ávidos por reformar a qualquer custo, desde que seja baixo, teimam em desobedecer esta regra básica. Fazendo um paralelo, seria como adoecessem e fossem procurar tratamento com um maqueiro, ou mesmo fossem implicados em um processo judicial e procurassem um despachante para orientá-los, nada contra maqueiros e despachantes, são importantíssimos, mas dentro da sua função. Mas em obras esta lógica não é obedecida e é exatamente aí que os problemas iniciam. Qual a saída para as edificações e suas administrações? Está muito claro que as figuras do síndico e a Engenharia estão no centro da solução. A norma orientativa já existe, é só por prática a NBR 16.280!

Essa inquietude com a imagem, despertou a exposição de alguns pontos recomendados pela bem elabora, mas infelizmente ainda não bem sucedida, NBR 16280. Vamos dividir em direitos e deveres do síndico e do condômino que quer reformar sua unidade; levando em conta as etapas antes, durante e depois dos serviços, apontando a necessidade da presença de um profissional de Engenharia.

1. Incumbências e Encargos do Responsável Legal pela edificação (Síndico) - ANTES DA REFORMA NA UNIDADE:
1.1. Deve disponibilizar a Convenção e o Regimento Interno do Condomínio, onde constam os documentos exigíveis, horários de trabalho, trânsito de insumos e trabalhadores e posturas e condutas no exercício do trabalho;
1.2. Tem o direito de receber o plano de reforma para análise técnica e legal - É necessária a presença de um profissional de engenharia;
1.3. Deve emitir documento de resposta ao plano de reforma, aprovando, aprovando com ressalvas ou reprovando - É necessária a presença de um profissional de engenharia;
1.4. Deve liberar o acesso de operários e insumos após o completo atendimento dos requisitos do plano de reforma;
1.5. Deve informar aos demais condôminos sobre a reforma e o atendimento das condições de início da reforma;
1.6. Tem o direito de paralisar os serviços proibindo a cesso de operários e insumos, caso encontre algo fora do acordado ou em caso de ser orientado tecnicamente É necessária a presença de um profissional de engenharia

2. Incumbências e Encargos do Responsável Legal pela edificação (Síndico) - DURANTE A REFORMA NA UNIDADE:
2.1. Deve verificar ou delegar a terceiros o atendimento ao plano de reforma proposto e aprovado - É necessária a presença de um profissional de engenharia;
2.2. Deve fazer cumprir que a reforma aconteça dentro das condições dispostas na Convenção e Regimento Interno do condomínio e, eventualmente, às deliberações de assembleias;
2.3. Deve tomar as ações necessárias em caso de risco para edificação e seu entorno ou usuários É necessária a presença de um profissional de engenharia.   

3. Incumbências e Encargos do Responsável Legal pela edificação (Síndico) - DEPOIS DA REFORMA NA UNIDADE:
3.1. Deve vistoriar ou delegar a terceiros as condições de finalização da obra conclusa - É necessária a presença de um profissional de engenharia;
3.2. Tem o direito de receber o termo de encerramento do serviço de reforma assinada pelo executante;
3.3. Deve cancelar as autorizações de entrada do pessoal envolvido na obra e da circulação de insumos;
3.4. Deve arquivar toda documentação relativa à obra. 

4. Incumbências e Encargos do Proprietário da Unidade Condominial em Reforma - ANTES DA REFORMA NA UNIDADE:
4.1. Deve fornecer ao Síndico toda documentação relativa à reforma, projetos, plano de reforma, ART de projetos, ART de execução da obra e demais documentos comprovatórios de atendimento às normas técnicas - É necessária a presença de um profissional de engenharia;

5. Incumbências e Encargos do Proprietário da Unidade Condominial em Reforma - DURANTE DA REFORMA NA UNIDADE:
5.1. Deve verificar se a execução da obra de reforma ocorre de acordo com as normas técnicas, de segurança e obediência aos regulamentos internos - É necessária a presença de um profissional de engenharia.

6. Incumbências e Encargos do Proprietário da Unidade Condominial em Reforma - DEPOIS DA REFORMA NA UNIDADE:
6.1. Deve fornecer cópias ao Síndico de toda documentação relativa à obra de reforma realizada, inclusive o termo de encerramento da mesma.

A elaboração do plano de reforma deve levar em conta itens que descrevam de forma clara e objetiva os mais variados aspectos da reforma - É necessária a presença de um profissional de engenharia. Esclarecendo, o plano de reforma deve dispor das ações e informações como: 

- Compromisso com preservação dos itens de segurança, acessibilidade e sustentabilidade da edificação;
- Apresentar e submeter ao incorporador/construtor e ao projetista qualquer alteração que afete a segurança da edificação e seu entorno, sujeito a aprovação em prazo legal;
- Ações de proteção contra eventuais danos e/ou prejuízos à vizinhos ou terceiros;
- Descrição clara e objetiva dos processos e métodos construtivos com: descrições, cronograma, apresentação de projetos e memórias de cálculo, utilização de materiais tóxicos ou inflamáveis, dados das empresas e funcionários envolvidos, descarte de resíduos, controle e recebimentos de etapas de serviço e determinação de local e forma de armazenamento de materiais;
- Informativo de alterações ou acréscimos de serviços no andamento da reforma, que estará sujeito à aprovação nos termos já relatados;
- Anotação de Responsabilidade Técnica - ART do CREA do projeto assinada pelo profissional que o elaborou;
- Anotação de Responsabilidade Técnica - ART do CREA da execução das obras assinada pelo profissional que irá executá-la;
- Demais documentos necessários a depender da legislação de cada localidade e dos regimentos internos e/ou determinações específicas de assembleias;
- Análise de viabilidade da reforma, assegurando também a não afetação do bom funcionamento da edificação não intervindo nos aspectos de manutenabilidade da mesma;
- Qualquer outro detalhe relevante que deva ser exposto, explicado e solicitado, devendo fazer constar no plano de reforma.

Ao final de uma reforma, o Manual de Uso, Operação e Manutenção e o Manual do Proprietário, devem ser revistos e atualizados nos termos de outra norma, a NBR 14.037 que dispõe sobre a elaboração e apresentação de conteúdos de planos de uso, operação e manutenção das edificações - É necessária a presença de um profissional de engenharia.

Identificadas as ações de cada parte, a NBR 16.280 ainda apresenta modelos úteis e facilitadores para elaboração de planos de realização de obras e reformas em edificações e um ordenamento através de um fluxo de gestão de obras e reformas em edificações.

Além da NBR 16.280, outras normas correlatas deve ser observadas como: NBR 5.671, NBR 5.674, NBR 9.077, NBR 12.721, NBR 14.037 e a NBR 15.575 - É necessária a presença de um profissional de engenharia

São ações que certamente não estão na rotina dos condomínios; muitos síndicos e condôminos as ignoram em detrimento de execuções anômalas e bizarras como a da imagem inicial que inquietou a todos, ou quase todos. Não pode-se fazer ideia de quantos serviços sem acompanhamento técnico, sem Engenharia, estão sendo realizados neste momento, mas constantemente estampam-se notícias de reformas que não deram certo, de prejuízos cobrados na justiça, de dessabores e desejos frustrados pela falta daquele profissional que deveria estar a frente das obras, o engenheiro. O condômino que irá realizar uma obra, deve contratar um engenheiro, o síndico que tem obra em seu condomínio deve contratar uma assessoria de Engenharia, deste modo as coisas ficam no seu devido lugar e o risco é mínimo.

Pense nisso. Faça isso.

Eng. Civil Patologista Lawton Parente
Esp. Engenharia Diagnóstica e Patologia das Edificações
Instagram: @eng_lawton_parente
Contato: +85 98767.0331

segunda-feira, 2 de dezembro de 2019

Um novo olhar sobre Desempenho de Sistemas Construtivos através do Tempo


Durante muito tempo os estudiosos da reabilitação das edificações dedicaram-se a entender como poderia ser agregada mais Vida Útil, mais Durabilidade aos seus sistemas e elementos construtivos. Mas quando temos a situação inversa? O que ocorre quando perdemos Vida Útil e Durabilidade? Em que situações as perdemos?

Para levar uma edificação a seus limites de Vida Útil de Projeto - VUP, e até mesmo ultrapassa-los, foram desenvolvidas Normas Técnicas vindas da fusão entre as boas práticas e os estudos técnicos. O olhar positivista, por vezes até um pouco ingenuo, daqueles que priorizavam manter as edificações, sempre foi ofuscada pelo pensamento comum da maioria de construir, construir e construir. Um estudante de Engenharia Civil é impelido a construção civil, isso tem muita engenharia envolvida, porém, o que fazer com todo patrimônio construído? Como mantê-lo? É um universo imenso de edificações construídas que necessitam de manutenção de qualidade, elas estão ganhado idade e estão entregues nas mãos de profissionais dos mais variados tipos. São médicos, advogados, bancários... muito prazer eles são os síndicos e administradores e tomam decisões de cunho técnico, na maioria das vezes em assembleia de condôminos nada técnicos, que tomam decisões de Engenharia em edificações jovens, maduras e até mesmo anciãs, com suas mais variadas características e usos. 

Nadando contra a corrente do construir, os bravos Engenheiros Patologistas, descobriram que era possível manter mais e melhor, ou seja, mais preventivos e menos corretivos. É muito importante entender que as manutenções corretivas nunca irão deixar de ocorrer, seja uma conexão hidráulica que danifica e gera vazamento ou uma corrosão de armadura que surge ou mesmo a queima de uma placa eletrônica do elevador, porém elas deveriam ser sempre inesperadas. Mas o se vê são manutenções corretivas por desleixo e negligência. Através da Lei de Sitter podemos até entender a escalada do prejuízo financeiro frente ao momento da decisão de recuperar um sistema ou um elemento construtivo.

Gráfico 1

Resultado de imagem para lei de sitter
LEI DOS 5 ou DE SITTER - Mostra que os custos de intervenção crescem em função do tempo e segundo uma progressão geométrica de razão cinco.

Os aplicados Engenheiros Diagnósticos criaram também caminhos para verificações técnicas com doses progressivas de complexidade de análise através da Engenharia Diagnóstica com seus 05 elementos na extraordinária sequencia: Vistoria, Inspeção, Auditoria, Perícia e Consultoria, e suas mais variadas sub-divisões e possibilidades, desde as constatações, análises técnicas, verificações de conformidades, elucidação de responsabilidades e prescrição da solução das manifestações patológicas. As aplicações destes métodos se tornam cada vez mais notadas, embora ainda precisamos de uma maior quantidade de engenheiros envolvidos. 

Gráfico 2

Manual de Engenharia Diagnóstica - Eng. Tito Lívio, Eng. Jerônimo Cabral e Eng. Marco Gullo

Os patologistas entenderam de forma efetiva que intervenções técnicas de qualidade, acompanhadas por profissionais não somente habilitados, mais sim capacitados, poderia sim estender o Desempenho das edificações através do tempo proporcionando assim Durabilidade, intimamente ligada à Vida Útil. O Desempenho de uma edificação, teoricamente, está em seu nível mais alto no momento de sua entrega (fim da obra) e quando começa a ser utilizada, submetida a cargas, reformas, intempéries, ataques químicos. Então, com passar do tempo, iniciam-se as necessidades de manutenções, intervenções técnicas, reabilitações, revitalizações (segmentos vermelhos do gráfico abaixo). Então o Desempenho é renovado, não completamente, mas existe o ganho. Deste modo conseguimos adiar o fim da Vida Útil através no aumento do Desempenho. 

Gráfico 3


Então em determinado momento tínhamos "a faca e o queijo na mão", como não aproveitar tudo isso? Como deixar passar uma oportunidade extraordinária de realizar diagnósticos, prever prognósticos e elaborar prescrições assertivas? Pois bem, com todos esses elementos de Engenharia, a sociedade não absorveu a ideia, seja por negligência ou de outro lado a falta de habilidade comercial dos profissionais e até mesmo o foco geral em construir, a verdade é que tínhamos mesmo "a faca e queijo nas mãos", mas deixamos passar uma bela oportunidade de cuidar melhor das nossas edificações.

No cenário da cidade de Fortaleza/CE, em 2019, tivemos vários exemplos de edificações com graves problemas, todas na faixa etária de 40 anos. Desabamentos, evacuações, perigosos desprendimentos volumétricos em fachadas... Coincidência? Não acreditamos. Analisando os fatos, na época da construção destas edificações (anos 70/80), projetavam-se obras para uma Vida Útil de Projeto de 50 anos, então o que houve com essas edificação para que não chegassem a este patamar? Pensando nisso imaginamos o que pode ser o inverso do Gráfico 3 - Tempo x Desempenho apresentado acima. Neste Gráfico 4 apresentado abaixo, creio que de forma inédita, mostramos, o que para nós, é efetivamente verdadeiro. Se com intervenções técnicas adequadas há o ganho de Desempenho e consequente Vida Útil de uma edificação, a falta delas as mitigará, catalizando a degradação da edificação fazendo com que seu comportamento ao uso seja reduzido, atacando prematuramente sua Vida Útil de serviço. Entenda-se falta de intervenção técnica adequada (segmentos vermelhos do gráfico abaixo) como: negligência, imprudência e imperícia.

Gráfico 4

Este é o resultado da não utilização da Engenharia ou de seu uso incorreto. Sem dúvidas essas ações orquestradas por leigos ou incapacitados continuarão resultando em sinistros e tragédias em todo país. Este Gráfico 4 explicaria o que está ocorrendo não só em Fortaleza, mas em várias partes do Brasil. Apontando a negligência (exemplo: falta de manutenção), a imprudência (exemplo: despreparo) e a imperícia (exemplo: desqualificação), percebe-se que é isso mesmo que ocorre em nossas edificações. No fundo sabemos como e quem realizam as "manutenções" (quando realizam), quais os critérios financeiros de escolha de executores (o menor preço e não a técnica), a falta de lealdade e de ética até mesmo entre profissionais.

Após um sinistro de grandes proporções como foi o caso do desabamento do Ed. Andrea em Fortaleza, fica o clima tenso de medo que desperta o senso de responsabilidade das pessoas, pena termos memória curta, então retoma-se a roda viva viciosa das decisões e ações indevidas nas edificações. Vamos mudar isso, chega de amadorismo!

Lawton Parente
Eng. Civil Patologista 

sexta-feira, 9 de março de 2018

Sistema de Revestimento Cerâmico Aderido - Interfaces e Rupturas

Neste artigo gostaria de expor uma análise técnica de algumas manifestações patológicas causadoras de ruptura nas interfaces das camadas de um sistema de revestimento cerâmico aderido em fachadas de edificações. Este sistema é o mais utilizado em fachadas revestidas com cerâmica nas edificações de múltiplos pavimentos no Brasil. Analisaremos as interfaces das camadas desde o substrato base de assentamento, desde a superfície da vedação, até sua face final, a própria peça cerâmica. Procurarei identificar, expor e analisar as características e os riscos do surgimento de anomalias construtivas nesses sistemas. Esses entendimentos são baseados na experiência prática, teórica e na ótica do que temos realizado na ENGETERRA, através de estudos técnicos de revitalização de fachadas e em milhares de metros quadrados executados em obras de fachadas revitalizadas. De forma lúdica, imaginemos o sistema de revestimento cerâmico aderido como um “sanduíche” de várias camadas. Embora existam vários tipos de sistemas, neste artigo analisaremos os mais usuais:

- Sistema de Camadas sobre alvenaria;

- Sistema de Camadas sobre estruturas de concreto.

Sistema de Revestimento Cerâmico Aderido

A variação do substrato base entre alvenaria ou concreto armado, a variação da espessura da camada de emboço por erros de prumada, os procedimentos de cura ou de aplicação da argamassa colante, são alguns fatores que pedem bastante atenção e determinam a escolha técnica de componentes de alguma camada ou implementação de técnicas e produtos adequados para cada caso.

Voltando as atenções aos sistemas escolhidos, contata-se que os dois tipos de situações são os mais corriqueiros em obras nacionais desta natureza e características, assim, se tornam fundamentais seus entendimentos, métodos construtivos, métodos de reparo e comportamentos ao longo de sua vida útil.

01. Sistemas de Camadas – Sobre alvenaria ou sobre concreto armado

O Sistema de Camadas sobre alvenaria é constituído por: alvenaria em bloco cerâmico, chapisco, emboço, argamassa colante e revestimento cerâmica; esse é o sistema mais simples e mais comum. Já o Sistema de Camadas sobre concreto armado é constituído por: concreto armado, chapisco colante, tela metálica, emboço, argamassa colante e revestimento cerâmico; este requer um pouco mais cuidado e técnica, pois novos “ingredientes” surgem no “sanduíche”.  Jamais nenhuma dessas camadas deve ser suprimida, seja qual for o sistema.

Seguindo a concepção de que quanto menos heterogêneo for um sistema, mais estável e confiável ele é, desde que obedecidas as exigências normativas e a boa técnica de execução, temos nesses sistemas uma base segura para a grande maioria das áreas revestidas no Brasil. Para os dois Sistemas de Camadas apontados, temos quatro interfaces, são elas:

1ª - Bloco de tijolo cerâmico ou Concreto armado/Chapisco ou Chapisco Colante;
2ª - Chapisco ou Chapisco Colante/Emboço;
3ª - Emboço/Argamassa Colante;
4ª - Argamassa Colante/Revestimento Cerâmico.

Antes da análise em si, faz-se importante compreender que o quesito mais significante quando tratamos de sistemas de revestimento cerâmico em fachadas é a ADERÊNCIA. Segundo o significado linguístico, temos para a palavra “Aderência” o seguinte: qualidade ou atributo do que é aderente, união de uma coisa com outra ou outras, junção; ou seja, aderência é tudo o que precisamos como aliada da segurança e da estabilidade em um revestimento de fachada em todas as suas interfaces. Partindo deste ponto, o que poderia prejudicar essa aderência nas interfaces dessas camadas?

02. Problemas de aderências entre as interfaces

Alguns fatores devem ser observados para que se entenda o porquê de haver problemas entre as interfaces de um sistema de revestimento cerâmico aderido em fachadas, mas todos eles irão migrar, preferencialmente, para o resultado final de falta aderência. Elegerei aqui cinco situações para analise, as mais usuais que venho encontrando nestes últimos anos de convívio prático e teórico com essas manifestações patológicas na cidade de Fortaleza/CE e em alguns lugares do Brasil. Para análise desses problemas nos sistemas escolhidos, convido a fazermos um passeio sobre a essência da Engenharia Diagnóstica, com seus elementos de: Diagnóstico, Prognóstico e Prescrição; fundamentos básicos para a Patologia das Edificações.

 02.01. Desprendimento volumétrico

 
Desprendimento volumétrico

DESCRIÇÃO: Trata-se de um desprendimento de todo volume de revestimentos, desde o chapisco até a cerâmica, incluindo toda a composição da massa de enchimento. Considero um dos mais perigosos sinistros em fachadas de edificações.

LOCAL DA RUPTURA: Normalmente ocorre na interface do substrato de Concreto Armado/Chapisco, não é comum vermos essa ocorrência em interfaces de Alvenaria/Chapisco.

DIAGNÓSTICO PROVÁVEL: Falta de aderência do chapisco na estrutura de concreto. A superfície de concreto se apresenta complemente aparente, como se fora recém desformada. As prováveis causas são: a falta de aderência da camada de chapisco com a peça de concreto e pode ser motivada por: contaminação (sujidades, pós, oleosidades, resíduos de fôrmas...) presente na face da peça de concreto a ser revestida, traço inadequado de chapisco (chapisco “fraco”), falta de cura do chapisco, grande espessura do revestimento argamassado, sobrecargas não projetadas, deformação lenta do concreto armado.

INÍCIO DA MANIFESTAÇÃO E PROGNÓSTICO PROVÁVEIS: Presença de som cavo quando submetido à percussão, surgimento de fissuras de repetidas na mesma região em pavimentos distintos, fissuras de borda, desprendimento do volume.

PRESCRIÇÃO PROVÁVEL: Na etapa de execução: Exigir projeto de completo de execução de fachada, seguir fielmente as indicações do projetista, exigir o alinhamento da estrutura de concreto armado da edificação para evitar altas espessuras de prumadas. Para obras de recomposição de revestimento cerâmico: Extração do volume comprometido, descontaminação do substrato, aplicação de chapisco colante com cordões horizontalizados sobre a estrutura de concreto, aplicação de tela metálica adequada e emboço de recomposição.

02.02. Argamassa colante – Tempo em Aberto excedido


DESCRIÇÃO: Trata-se da ultrapassagem do tempo permitido ao pedreiro para que ele assente um revestimento cerâmico sobre uma argamassa colante fresca aplicada na superfície da fachada.

LOCAL DA RUPTURA: Normalmente ocorre na interface Argamassa Colante/Revestimento Cerâmico.

DIAGNÓSTICO PROVÁVEL: Falta de aderência do revestimento cerâmico à argamassa colante. Por algum motivo (desatenção, imprudência, imperícia...) o pedreiro assentador aplica uma camada de argamassa colante em uma área muito extensa ou realiza um assentamento de forma morosa. O tempo em aberto está intimamente relacionado com a dimensão do pano de aplicação aberto pelo pedreiro e sua velocidade de assentamento. É certo que, ultrapassado este tempo, a argamassa se torna imprópria a receber cerâmica, pois já iniciou seu processo de endurecimento. Com o desprendimento das peças cerâmicas, serão perceptíveis os cordões não desmanchados de argamassa colante deixados pela desempenadeira dentada.

INÍCIO DA MANIFESTAÇÃO E PROGNÓSTICO PROVÁVEIS: Presença de som cavo quando submetido à percussão, eventualmente formações abauladas (“barrigas”) no revestimento cerâmico, desprendimentos de peças recorrentes com pouca ou nenhuma argamassa em seu tardoz.

PRESCRIÇÃO PROVÁVEL: Na etapa de execução: Abrir panos de assentamento de acordo com a velocidade de assentamento do pedreiro, mas preferencialmente com dimensões de no máximo 1m², em locais com presença de agente catalizadores de secagem superficial (insolação, calor, ventos...) utilizar as argamassas com aditivos de para tempo estendido (tipo AC III – E). Para obras de recomposição de revestimento cerâmico: após a extração de todo revestimento cerâmico e das áreas com argamassa colante instáveis, recompor a planicidade, aplicar o novo revestimento cerâmico e recompor as juntas elásticas. Nunca aplicar mais água à mistura.

02.03. Arraste de assentamento não executado

  
Arraste com as mãos          -          Cordões desmanchados

DESCRIÇÃO: Trata-se do posicionamento inicial, momento do assentamento, da peça cerâmica ou da tela de peças próximo a sua posição definitiva. A partir deste contato inicial com o substrato base de assentamento, é promovido o arraste, com as mãos, para o ponto final de paginação da peça fazendo com que os cordões deixados pela desempenadeira dentada sejam desmanchados.

LOCAL DA RUPTURA: Normalmente ocorre na interface Argamassa Colante/Revestimento Cerâmico.

DIAGNÓSTICO PROVÁVEL: Falta de aderência do revestimento cerâmico à argamassa colante. Por algum motivo (desatenção, imprudência, imperícia...) o pedreiro assentador aplica o revestimento cerâmico sem a técnica do arraste. Usualmente utilizando somente uma marreta de borracha para bater nas peças cerâmicas, os cordões não são desmanchados, a área de contato cerâmica/argamassa colante fica reduzida e a aderência de colagem comprometida. Com o desprendimento das peças cerâmicas, serão perceptíveis os cordões de argamassa colante amassados e não desmanchados.

INÍCIO DA MANIFESTAÇÃO E PROGNÓSTICO PROVÁVEIS: Presença de som cavo quando submetido à percussão, eventualmente formações abauladas (“barrigas”) no revestimento cerâmico, desprendimentos de peças recorrentes com pouca ou nenhuma argamassa em seu tardoz.

PRESCRIÇÃO PROVÁVEL: Na etapa de execução: Exigir do assentador o arraste das peças ou placas de peças com as mãos (com treinamento e capacitação) e restringir o uso da marreta de borracha a pequenos ajustes de posicionamento das peças ou telas. Para obras de recomposição de revestimento cerâmico: após a extração de todo revestimento cerâmico e das áreas com argamassa colante instáveis, recompor a planicidade, aplicar o novo revestimento cerâmico e recompor as juntas elásticas.

02.04. Descolamento cerâmico por pulverulência de substrato

 Descolamento cerâmico por pulverulência de substrato

DESCRIÇÃO: Trata-se de um descolamento e desprendimento de revestimento cerâmico por falta de adesividade proporcionada pelo excesso de partículas soltas (pulverulência) na face externa da camada de revestimento argamassado – Emboço.

LOCAL DA RUPTURA: Na interface Emboço/Argamassa Colante.

DIAGNÓSTICO PROVÁVEL: A peça cerâmica se desprende trazendo, normalmente toda argamassa colante presa ao seu tardoz, assim, a aderência na interface cerâmica/argamassa colante está preservada, porém, na interface argamassa colante/emboço percebe-se uma fina do emboço camada pulverulenta presa à argamassa colante. As prováveis causas são: falha ou falta de cura do revestimento argamassado – Emboço, os finos do agregado do emboço absorvem mais água que seus aglomerantes que não reagem totalmente, excesso de aglomerante (nem todos se transformam em ligante) deixando partículas sem reação, excesso de exsudação, exposição demasiada do emboço recém-executado à agentes catalizadores de secagem superficial (insolação, calor, ventos...).

INÍCIO DA MANIFESTAÇÃO E PROGNÓSTICO PROVÁVEIS: Presença de som cavo quando submetido à percussão, eventualmente formações abauladas (“barrigas”) no revestimento cerâmico, desprendimentos de peças recorrentes trazendo uma fina camada de emboço (01-02mm).

PRESCRIÇÃO PROVÁVEL: Na etapa de execução: No momento da execução do emboço, mitigar fatores que possam extrair água da superfície deste revestimento argamassado, como evaporação, insolação, exsudação e ventos que ressecam sua face externa. Promover cura adequada e checar traços propostos. Para obras de recomposição de revestimento cerâmico: deve ser extraída esta fina camada por meio de desbaste rotativo e verificar, através de testes e ensaios técnicos, a possibilidade deste revestimento argamassado original ser recomposto e reutilizado para assim receber um novo revestimento cerâmico.

02.05. Excesso de engobe no tardoz das peças

 
 Excesso de engobe no tardoz das peças

DESCRIÇÃO: Trata-se de uma presença excessiva de engobe (pó branqueado) no tardoz das peças do revestimento cerâmico.

LOCAL DA RUPTURA: Ocorre na interface Argamassa Colante/Revestimento Cerâmico.

DIAGNÓSTICO PROVÁVEL: Falta de aderência do revestimento cerâmico à argamassa colante. Por algum motivo (erro em processo industrial, imprudência, imperícia...) a indústria ceramista aplica mais engobe no tardoz das peças cerâmicas que o aceitável. O engobe cumpre o papel de auxiliar na movimentação das peças cerâmicas recém-fabricadas nas esteiras da fábrica, aplicado em excesso, se torna um material isolante muito prejudicial à aderência no momento da aplicação do revestimento cerâmico na fachada.

INÍCIO DA MANIFESTAÇÃO E PROGNÓSTICO PROVÁVEIS: Presença de som cavo quando submetido à percussão, eventualmente formações abauladas (“barrigas”) no revestimento cerâmico, desprendimentos de peças recorrentes com pouca ou nenhuma argamassa em seu tardoz, presença de engobe na seção de ruptura.

PRESCRIÇÃO PROVÁVEL: Na etapa de execução ou para obras de recomposição de revestimento cerâmico: Observar previamente o revestimento cerâmico quanto a presença de engobe. Sempre irá existir o engobe, mas caso em excesso, opte por devolver o produto ou por extrair de forma eficaz este material.

03. Comentários e conclusão

Estas cinco situações apresentadas são bem distintas, ao ponto de sua sintomatologia tornar menos difícil o trabalho do perito ou do patologista. Me deparo constantemente com essas situações de risco, edificações necessitando urgentemente de manutenções corretivas. Percebo de forma muito clara vários casos em que os usuários de algumas edificações contam com a sorte divina de não ocorrer acidentes graves ou fatais, já os de outras edificações são mais cautelosos. Como de costume, não custa lembrar:
Concluo que, se observados estes pontos, certamente serão suprimidas as maiores e mais corriqueiras manifestações patológicas originárias de anomalias construtivas nas interfaces dos sistemas de revestimento cerâmico aderido, e ainda, se reparadas como exposto, tem-se uma condição extraordinária de obtermos um desempenho satisfatório, uma vida útil renovada e uma edificação segura.

     Engº Civil Esp. Lawton Parente
j
    - Construtor, Consultor e Professor
    - Pós-Graduado em Engenharia Diagnóstica e Patologia das Edificações
    - Associado ao Instituto de Engenharia de São Paulo
    - Diretor Técnico - IBAPE-CE - Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia
    - Conselheiro Regional - CREA-CE - Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Ceará 
    
   CONSTRUTORA ENGETERRA - Revitalizando e valorizando patrimônios
   ENGETERRA DIAGNÓSTICA - Estudos Técnicos de Engenharia

   Fone: +85 3472.1674
   Cel. Corporativo: +85 9.98158.5880    
    Facebook/LawtonParente 

segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

Cerâmica sobre pintura - Nunca

Muro de residência - Cerâmica sobre pintura

Não é muito difícil encontrarmos este tipo de problema de desplacamento de peças cerâmicas nas edificações, mas, porque, neste caso específico, isto ocorre? A origem será a cerâmica? Ou a argamassa colante? Ou mesmo o reboco? Ou existe algo diferente desses elementos construtivos, que ocasiona o insucesso da aderência deste sistema de revestimento cerâmico? Vamos colocar nosso espírito investigativo para funcionar e verificar o que houve e como poderia ser evitado.

Pela imagem, percebe-se que trata-se de muro de uma residência e que, inicialmente, possuía revestimento de pintura a base cal. Certamente o proprietário, pensando em valorizar seu imóvel e acabar com a necessidade de repinturas, resolveu aplicar nesta área um revestimento cerâmico. Esta decisão realmente alcançaria o objetivo, porém houve claramente falta de técnica que resultou no insucesso.

Tecnicamente o que ocasionou esta manifestação patológica, o desprendimento de peças cerâmicas, não foi a cerâmica, nem a argamassa colante ou o reboco, aliás poderíamos utilizar os esses materiais na categoria mais nobre a disposição no mercado, mesmo assim essas peças se desprenderiam, e porquê? Porque o método de preparo da área de assentamento e a execução foram extremamente infelizes, sem nenhuma técnica adequada. Nunca deve ser aplicado revestimento cerâmico sobre revestimento de pintura, lembre-se, NUNCA. A camada de tinta torna-se um isolante natural na interface reboco/argamassa colante. Dois motivos básicos são os responsáveis para esse isolamento:

a) A camada de tinta veda os poros do reboco ou emboço, fundamentalmente necessários para o bom desempenho de certos tipos de argamassas colantes que atuam através do preenchimento desses canais de capilaridade, formando uma micro-ancoragem extremamente saudável à preservação da aderência. Verificando a figura temos:
  

No caso (1), no caso de reboco ou emboço, os seus poros estão abertos e a argamassa colante penetra nesses capilares formando a micro-ancoragem, tornando assim uma situação favorável à aderência. No caso (2), de forma errada a argamassa colante foi aplicada sobre a camada de pintura (tinta), não havendo a necessária penetração, pois a tinta já é o agente preenchedor desses poros capilares.

b) Alguns tipos de argamassa colante não necessitam dos poros para conferir aderência a um revestimento cerâmico, como por exemplo as do tipo indicadas para sobre-colagem de revestimentos, mesmo elas, não conseguiriam obter bom desempenho nestes casos, pois o fator pulverulência (presença de pós) na camada de tinta, causa o isolamento naquela interface; o grau pulverulência pode aumentar de acordo com o tipo e a qualidade da tinta e seus componentes. Outro ponto a ser observado é a constatação de que o revestimento cerâmico usa uma fina camada de tinta como base fixação, ou seja, uma camada de tinta (frágil) “segurando” um revestimento cerâmico.

Isto posto, podemos tomar algumas conclusões e observações:

- Na condição de aplicar revestimento cerâmico sobre camada de pintura, nem utilizando os melhores materiais, teremos aderência e, só o acaso poderá manter este revestimento aderido por muito tempo sem ocorrer desprendimentos de peças;

Fragilidade do contato - Restiram-se peças com a mão

- Percebemos que na base de assentamento fora aplicado picotes, esses furos que intencionam conferir mais atrito, pois bem, não exercem função alguma;

Picotes em substrato base

- Em qualquer momento do problema, as juntas elásticas de movimentação ou dilatação não resolveriam. Nem se fossem aplicadas no momento da execução do serviço;

- Neste caso especificamente, estas peças cerâmicas deveriam ser assentadas com o método da dupla colagem (pelas suas dimensões). Percebemos que não foi apliicado o método e nem sequer os cordões de argamassa colante deixados pela desempenadeira dentada foram desfeitos. Mesmo assim, com um assentamento cerâmico muito deficitário, a argamassa colante não aderiu ao substrato (tinta) permanecendo no tardoz (parte de trás) da peça cerâmica, o que demonstra a fragilidade da interface argamassa colante/substrato de assentamento.

Cordões de argamassa colante não foram foram desfeitos.

E como este serviço deveria ter sido executado para que não tivesse obtido um desempenho tão pífio? A resposta seria:

Verificar as condições de composição e estabilidade do reboco;
- Extrair completamente a camada de pintura deixando com rugosidade similar a de um emboço;
- Aplicar uma camada de argamassa de transição e nivelamento;
- Aplicar o revestimento cerâmico utilizando materiais adequados e as técnicas normativas.


Lembram da falta de técnica apontada no começo deste artigo? Pois bem, é muito comum pessoas não técnicas tomarem decisões as quais cabem a um técnico ou um especialista no assunto, isso torna a situação necessariamente dependente da sorte ou de “profissionais” desqualificados tecnicamente. Vez por outra escutamos bordões desses tipos de "profissionais": “mas eu faço assim há muito tempo, e nunca tive problema...”. Será? Será que ele retornou algum tempo depois para conferir o desempenho do seu serviço? Se realmente não ocorreu problemas? Certamente não volta. Tempos depois, o tal problema aparece. Para isso existem os profissionais especialistas, os produtos de qualidade e as técnicas adequadas, até mesmo para simplesmente aplicar uma cerâmica em um muro.

     Engº Civil Esp. Lawton Parente
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    - Construtor, Consultor e Professor
    - Pós-Graduado em Engenharia Diagnóstica e Patologia das Edificações
    - Associado ao Instituto de Engenharia de São Paulo
    - Diretor Técnico do IBAPE-CE - Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia do Ceará
    - Conselheiro e Diretor do CREA-CE - Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Ceará 
    
   CONSTRUTORA ENGETERRA - Revitalizando e valorizando patrimônios
   ENGETERRA DIAGNÓSTICA - Estudos Técnicos de Engenharia



   Fone: +85 3472.1674
    

    Email: engenharia@construtoraengeterra.com
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